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Execução antecipada da pena é inconstitucional, diz STF

Advogados que atuarao no julgamento posam para fotos antes do inicio da sessao de julgamento da prisao em segunda instancia no STF (Advogados que atuarao no julgamento posam para fotos antes do inicio da sessao de julgamento da prisao em segu

Para presidente do IDDD, decisão é vitória daqueles que acreditam que a Justiça não deve servir para satisfazer clamores populares

Na noite desta quinta-feira (7), o STF (Supremo Tribunal Federal) declarou inconstitucional a prisão antes do trânsito em julgado – ou seja, antes que se esgotem as possibilidades de recurso em um processo penal. A decisão foi tomada no âmbito de três ADCs (Ações Declaratórias de Constitucionalidade) que aguardavam julgamento desde 2017. 

Dos 11 ministros, seis julgaram constitucional o artigo 283 do Código de Processo Penal, segundo o qual “ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência da sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva”.

Para o presidente do IDDD (Instituto de Defesa do Direito de Defesa), entidade que foi admitida no caso como amicus curiae, o debate encerrado nesta quinta é um marco na luta pelo direito de defesa. Hugo Leonardo afirmou que a Corte “deu um passo decisivo para recuperar o sentido da presunção de inocência” e que, em um contexto de politização da Justiça, deve prevalecer a proteção dos princípios constitucionais.  

“Era um caso extremamente simples do ponto de vista técnico, porque o texto constitucional é claríssimo, mas infelizmente a discussão foi tomada por um moralismo de fachada, por uma irracionalidade cega para as falhas do sistema de Justiça brasileiro”, afirmou o advogado. “A decisão de hoje não será capaz de compensar as injustiças e os dias de liberdade arbitrariamente tirados de milhares de pessoas nos últimos anos, mas é um marco importante para a retomada da nossa segurança jurídica. Ela é, ainda, uma vitória daqueles que acreditam que a Justiça não deve estar a serviço do clamor popular, mas da garantia de direitos.”

De acordo com o CNJ (Conselho Nacional de Justiça), atualmente há mais 800 mil pessoas presas no Brasil, sendo que 24% desse total não esgotaram a possibilidade de recursos. Recentemente, o CNJ divulgou que pouco mais de 4 mil pessoas poderão ser beneficiadas pela decisão do STF. 

Veja o histórico do debate a respeito da prisão em segunda instância:

Em 2009 o STF enfrentou o tema da execução provisória da pena no julgamento de um pedido de habeas corpus relatado pelo então ministro Eros Grau (HC 84.078/MG). Na ocasião, a Corte, por 7 a 4, decidiu pela inconstitucionalidade da execução antecipada da pena de modo que que a prisão antes do trânsito em julgado da condenação somente poderia ser decretada a título cautelar.

Esse entendimento valeu até 2016. Em um caso de habeas corpus relatado pelo ministro Teori Zavascki (HC 126.292/SP) e julgado em fevereiro daquele ano, a Corte passou a admitir, por sete votos a quatro, a execução provisória da pena antes do trânsito em julgado da condenação.

Em outubro daquele mesmo ano, o STF deu início ao julgamento de duas ADCs, a 43 e a 44, que questionavam esse entendimento. A decisão foi apertada: por seis votos a cinco, a Corte determinou que não havia incompatibilidade entre a execução provisória da pena e o respeito ao artigo 283 do CPP. Foram vencidos os ministros Marco Aurélio, Celso de Mello, Ricardo Lewandowski, Rosa Weber e Dias Toffoli.

Um dos ministros que votou pela manutenção da possibilidade de prisão após segunda instância foi o ministro Gilmar Mendes, que desde então reviu sua posição e tem concedido inúmeros habeas corpus para suspender prisões após segunda instância.

Em um Recurso Extraordinário com Agravo (964.246), também relatado por Zavascki e julgado em novembro de 2016, uma maioria de 6 a 4 decidiu, através do plenário virtual do Supremo, reafirmar a execução provisória da condenação, mesmo havendo a possibilidade de recurso a instâncias superiores. A ministra Rosa Weber não se manifestou no caso.

Mais recentemente, no habeas corpus 152.752 apresentado em favor do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e julgado em abril de 2018, a ministra reafirmou a posição manifestada por ela em 2016, no sentido da inconstitucionalidade da aplicação de pena antes do esgotamento dos recursos. Disse, entretanto, que o que estava em jogo era a aplicação do entendimento da Corte a um caso concreto e ajudou a formar maioria (com ressalvas) favorável à execução antecipada da pena.

Em dezembro de 2018, o ministro Marco Aurélio Mello, relator do caso, expediu liminar determinando a soltura de todas as pessoas em execução provisória da pena. A medida não contemplava pessoas presas preventivamente – ou seja, excluía pessoas que, na visão dos juízes, poderiam oferecer risco à sociedade ou ao andamento do processo. A decisão monocrática de Marco Aurélio foi derrubada horas depois pelo presidente da Corte, Dias Toffoli, em resposta a pedido da Procuradoria-Geral da República.

Em 2019, Dias Toffoli coloca as ADCs em pauta e abre caminho para a decisão de hoje, que declarou a inconstitucionalidade da prisão antes do trânsito em julgado.

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